O texto fala de gratidão, ou melhor, de ingratidão. Vemos Jesus transpassando limites de Samaria sentido Galiléia, e encontrando dez leprosos, que não pediram cura, apenas misericórdia; nove eram judeus e um samaritano. O horror dos nove, além da lepra, era ter que conviver com um samaritano.
Gratidão do latim gratitutine é a qualidade de quem é agradecido; é reconhecimento, retribuição, premiação. É o mesmo peso da palavra grega “eucaristia”. A doutrina católica e metodista da transubstanciação usa eucaristia para sustentar a presença de Cristo no pão e no vinho. Mas o sentido é gratidão, de dar graças.
Motivos que apontam a falta de gratidão:
1. Veio da falta de percepção do que Jesus fez por eles. A miséria que a lepra trouxe e a duração desse mal cegaram e endureceram o coração da maioria. Apenas um percebeu isso: “E um deles, vendo que estava são…” [14]. A cura foi para maioria só mais uma esmola.
2. Aconteceu por que a maioria achava que tinha o direito a uma vida como a vida de todos os outros. Pedir misericórdia [13] e depois esquecer-se [15] é ingratidão. Jesus ali, não teria feito mais do que sua obrigação, já que quem estava em débito era o próprio Deus. Deus não deve nada a ninguém!
3. Formou-se pela falta de discernimento de quem Jesus era. Chamaram-no, no grego, de Epistates [13]; um mestre com bastante autoridade, comandante, encarregado. Viram alguma autoridade em Jesus, mas não o Senhorio como o Centurião [Lc 7.6-9], ou a Majestade como Bartimeu [Mc 10.46-47], ou como Messias como André [Jo 1.41].
4. Virou fato quando os nove, concentrados apenas em obedecerem à regra, criaram no coração um senso meritório [14]. Ao obedecerem à regra da Torá, a cura não poderia ser mais ato da graça de Jesus, mas resultado ditado pelo esforço: “Eu fiz algo para merecer”. Quem fez por merecer não tem nada para agradecer!
5. Questões éticas também agiram para a ingratidão. Nove representavam os israelitas, aliançados com YWHW, e estavam tão afixionados pela sua própria história e geografia como elementos suficientes para gerar curas [Jo 5.1-7]. Nossa época reproduz aqueles que dizem: “Sou cristão, membro da Igreja X ou Y, e estou debaixo da unção C, L, P. Isto basta”.
6. Aconteceu por que na ânsia de ficarem bem com todos (vizinhos, parentes, familiares, sacerdotes), tiraram os olhos do foco maior da purificação. Tornarem-se puros [14], seria um ato para Deus e não à humanos. Quando a preocupação é apenas cumprir requisitos da lei e cerimoniais ao “chefe” não haverá gratidão. O religioso é um ingrato!
7. Veio por que o exercício disciplinado do louvor estava ausente [16]. Falta louvor exacerb a ingratidão. A lepra gerou insensibilidade a ponto de não atentarem às coisas boas que a vida lhes deu. Não é assim hoje? Tudo fica resumido a minha carência pessoal?
8. A incredulidade (falta de fé) também gerou ingratidão. Só ao samaritano grato é que Jesus diz: “Levanta-te e vai; a tua fé te salvou” [19]. Se Deus habita no meio dos louvores, a ingratidão nos leva para longe de Deus.
9. Falta de gratidão é falta de noção do que é a graça de Deus e do que é o Deus da graça. A maioria ocultar-se de Cristo que pergunta: “E onde estão os nove?” [17]. Mesmo agraciado o ingrato não se apresenta. Sua culpa ainda é maior que seu milagre. Mas o samaritano está presente; e não podia nem queria esconder seu passado. Voltou testemunhando e adorando, enquanto a maioria nunca percebe que já está curado!